Por Naiara Guimarães
Ocupando o cargo de Presidente da Associação Folclórica Boi-Bumbá Garantido desde o ano de 2010, Francisco Walteliton de Souza Pinto, ou simplesmente Telo Pinto, teve destaque com a implantação de um sistema administrativo onde o sócio se tornou mais participativo dos atos da associação. Também trouxe consigo uma nova perspectiva de agregação de valores folclóricos ao boi-bumbá, quando inseriu a festa com brincantes de outros movimentos populares da região norte. Foi inovador ao lançar o primeiro DVD dos bois, que embalou em 2011 um novo formato de apresentação dentro do Bumbódromo, o que o levou ao título, sempre resguardando a tradição do Garantido, tornando o espetáculo extremamente técnico e preciso. Em uma entrevista descontraída em sua casa, Telo nos conta sobre sua trajetória como presidente do boi Garantido, carinhosamente também chamado de boi do povão.
Naiara
Guimarães: Com
problemas financeiros oriundos da administração anterior, quais
foram as rincipais dificuldades encontradas o seu primeiro ano de
mandato? A derrota na arena neste ano teve influencia direta com
esses fatos?
Telo
Pinto:
Recebemos
o boi de uma forma complicada do ponto de vista financeiro,com muitas
dividas frutas dos desmandos da administração anterior, e organizar
a casa não foi fácil. Foi preciso fazer um levantamento de dívidas,
bem como suas negociações e instalar uma nova estrutura
administrativa, para que pudéssemos começar a pensar em fazer um
grande festival. E naquele ano não considero o Garantido derrotado,
pois foi trabalhado em cima de muita superação frente as
adversidades financeiras e da própria estrutura do Boi, como por
exemplo o caso do Davi Assayag que deixou o Garantido de uma forma
que nos entristeceu e que causou muito desconforto, e que abriu uma
lacuna que mais tarde veio a ser preenchida por Robson Jr, que
nomeamos como Levantador, mas que por uma infelicidade do destino,
teve um problema de saúde que nos deixou a poucos dias do festival
sem perspectivas de preencher esse cargo tão importante que é o de
levantador de toadas. Somente a dois dias do festival tivemos a
felicidade de encontrar o jovem Sebastião Jr que nunca havia
participado se quer de um único ensaio do nosso boi como cantor. Mas
ainda voltando ao fato de termos perdido, também tivemos um problema
que considero terrível na parte de concepção artística, pois
fizemos um boi grande demais para o tamanho da arena, o que ocasionou
na perda de minutos preciosos que foram determinantes para o desconto
de pontos na apuração.
N.G:
Em
2011, com uma postura arrojada, o Boi Garantido lançou um DVD,
considerado por muitos a melhor seleção de toadas de todos os
tempos, além disso, trouxe para somar ao seu elenco de dançarinos
um grupo de Jurutí que foi fundamental nas coreografias de tribos e
corpo cênico, e ainda teve a consagração de Sebastião Júnior,
que conquistou seu espaço e torcida como Levantador de Toadas. Com
tudo isso, e o título nas mãos naquele ano, como você avalia seu
segundo ano a frente do Bumbá?
T.P:
Considero
um dos festivais mais bonitos feitos pelo Boi Garantido. Falar do
festival de 2011 nos remete a um sentimento nostálgico, do ponto de
vista da concepção artística e do desprendimento que o boi teve.
Foi um festival que começou dando certo desde a ideia inicial de se
fazer um DVD, até o Bumbódromo, e havia uma movimentação muito
forte em relação a busca pela vitória do Garantido. Eu considero o
festival de 2011 um marco para todos nós, ali se encerrava um ciclo,
e era dado inicio a outro, e encerramos de forma brilhante ganhando o
festival. O CD/DVD Miscigenação é grandioso e tem toadas que
marcaram época e que vão se eternizar ao longo dos anos. Mas sempre
com os pés no chão, sabendo que enfrentaríamos as dificuldades,
principalmente as dívidas, mas acima de tudo, assumindo o
compromisso de resgatar o nome do Boi Garantido. Pois tão importante
quanto um título, para mim é vencer nossas batalhas jurídicas e
financeiras.
N.G:
Novamente
com um projeto estabelecido nos moldes do ano anterior, em 2012, o
Mega Show de Gravação do DVD do Garantido, que teve como palco um
Bumbódromo completamente tomado de vermelho, trazia a impressão de
que por mais um ano o Garantido seria imbatível. Entretanto, o
contrário apresentou uma estrutura muito semelhante, muitos dizem
até copiada. Isso foi determinante para que o Garantido perdesse o
título de 2012? Você considera que a estrutura atual do boi de
arena foi copiada e superada pelo adversário naquele ano?
T.P: Começamos
o ano de 2012 com muito foco em engrandecer ainda mais o trabalho que
havíamos iniciado em 2011. Com um projeto grandioso que nos remeteu
a um desafio que foi enfrentado com sucesso por todos nós que foi a
gravação de um DVD no Bumbódromo, onde nos perguntávamos se
conseguiríamos enchê-lo de vermelho, e a galera vermelha e branca
deu a resposta que queríamos, fazendo daquele dia um marco em
Parintins. Muitas pessoas vieram de outras cidades, e aquela gravação
do nosso DVD fez parecer que aquela era uma noite de festival
acontecendo em Janeiro, tamanho foi o movimento de camisas
encarnadas. O aeroporto foi super movimentado, barcos e lanchas
atracavam de todos os lugares, enfim, houve um supermovimento por
causa dessa gravação, o que nos deixou bastante confiantes.
Infelizmente, por questões adversas a nossa vontade, tivemos
inúmeros problemas, e o prior problema que considero foi a enchente,
que nos obrigou a montar uma estrutura completamente improvisada para
a confecção das nossas alegorias. No meu ponto de vista aí começou
o declínio do nosso astral. Somado a isso, vieram os bloqueios
judiciais de repasse de recursos que nos levou a um extremo de
incertezas dentro do próprio boi. Somado a isso, acumulamos inúmeras
despesas demandadas por conta da as´da da nossa estrutura de galpão
para a rua. Isso ao final nos desgastou para a arena e não
conseguimos ter a força necessária para o título.
N.G:
Neste
mesmo ano, um fato inédito aconteceu na arena. Você poderia
esclarecer qual foi o fator que ocasionou o atraso para a
apresentação do Garantido em uma das noites?
T.P: Em
2012, o contrário estava muito nervoso, havia perdido no ano
anterior, e tiveram que assistir a cidade ser tomada por completo de
vermelho em janeiro. Isso os levou a cometer uma série de atitudes
contrario Garantido que julgo impróprias para que a festa continue
seguindo num tom de brincadeira. O fator veio daí, o contrário
sabotou o equipamento elétrico dos cabos de iluminação do
Bumbódromo, que dão movimento e luz as alegorias. Isso foi
comprovado por perícia e isso ocasionou no esfriamento da Galera, é
claro, depois de enfrentar horas de filas por aquele momento e ter
que passar por mais essa celeuma, é revoltante.
N.G:
O
boi também sofreu com a chuva em dois principais momentos da sua
apresentação. Você entende que o fator natureza pode ter tido peso
nas notas recebidas?
T.P: A
natureza conspirou contra. Além da grande enchente, ainda tivemos de
enfrentar, na noite que considerávamos a mais espetacular do ponto
de vista artístico, em um ponto alto de nossa apresentação, 30
minutos de chuva torrencial. Mas nos mantivemos, lutamos, e acredito
que mesmo com essas adversidades conseguimos mostrar um boi de
qualidade frente a tantas dificuldades, cofiando sempre e acima de
tudo em Deus para continuarmos com esse trabalho.
N.G:
O
ano de 2013 começa marcado por um embate entre um empresário local
e o Garantido pela posse de uma área pertencente ao Boi que foi a
leilão por decisão da justiça. Você poderia esclarecer qual é a
atual situação deste ocorrido? O Garantido pode realmente perder
este patrimônio?
T.P: No
final do ano de 2012 para o inicio de 2013, tivemos esse problema que
abalou nossa estrutura, por conta de um leilão de um patrimônio do
Boi Garantido. É bom que se esclareça que esse galpão não foi
leiloado por conta de nossa revelia. Buscamos a conciliação com os
causadores do processo, e sempre brigamos juridicamente até a ultima
instancia para sanar estas dividas. Infelizmente esse era um embate
que se arrolava desde 2007e que veio a nos surpreender na instancia
final onde tínhamos que dispor de R$50.000,00 para suspender o
leilão, porém naquele momento o boi não tinha essa quantia devido
os bloqueios que constantemente nos assombravam. O patrimônio foi
adquirido por Francisco Vasconcelos, imediatamente tentamos um acordo
com este empresário e chegamos a uma negociação. Infelizmente
outras pessoas que tinham interesse contrário ao bem estar do
Festival, se envolveram na negociação, chegando a fazer propostas
volumosas ao empresário por este pedaço do Garantido. Isso nos
levou a ter um embate jurídico junto aos tribunais e hoje se
encontra suspensa a emissão de posse e ação do empresário nesta
área do boi até que a corte dos desembargadores do Estado do
Amazonas votem e deliberem pelo melhor comum. Estamos aguardando essa
decisão, até lá continuaremos seguindo normalmente os trabalhos.
N.G: É
constantemente anunciado na rádio, e televisão, que por conta de
dívidas acumuladas ao longo de várias administrações, o Boi
Garantido vem sofrendo com constantes bloqueios de suas contas. Como
você pretende lidar com este problema que deve influenciar
diretamente na construção do boi de arena? Você vislumbra uma
solução a curto prazo? Esse problema também pode pesar
negativamente na produção e execução do já tradicional e
aguardado DVD do Boi Garantido neste ano do centenário?
T.P:
É
uma coisa que nos preocupa e que nos leva a ter uma atenção mais
minuciosa. São inúmeras as ações contra o boi na justiça, como o
caso da ex-Cunhã Poranga Jakeline Matos que teve um acidente em
1994, e que hoje chega em instancia final, onde temos que sentar e
negociar para chegar um acordo que não venha a prejudicar todo o
projeto financeiro do boi para o ano. Mas temos a consciência
orçamentária devida para trabalhar o boi de arena com a
responsabilidade que nos proporcionará fazer um belíssimo
espetáculo, sempre buscando o entendimento e a conversa para
fazermos os trabalhos do ano, que já começam agora com agravação
do DVD O Boi do Centenário.
N.G:
2013
é anunciado com uma renovação no quadro de itens do Garantido. O
posto de Porta Estandarte, ocupado até então por Raissa Barros,
está sendo cobiçado por inúmeras jovens que sonham com a
oportunidade de defender as cores vermelho e branco. Coma seleção
em sua reta final, o que você espera encontrar na futura Porta
Estandarte? Você acredita que mais mudanças de itens individuais
possam acontecer até o final de sua gestão? Você vê como
necessária essa renovação para que haja um envolvimento social
maior com o boi entre os jovens que desejam fazer parte dessa festa?
T.P: Uma
cobrança natural da comunidade do Garantido é a questão do tempo
de permanência de cada item individual no seu cargo, principalmente
os itens femininos. Tenho sido muito indagado no boi sobre essa
questão. Esse ano tivemos um caso atípico, pois nossa Porta
Estandarte, por motivos pessoais se desligará do item, abrindo
também o espaço para se pensar sobre a permanência dos que agora
estão. Temos feito avaliações, principalmente por que alguns deles
não moram em Parintins e o boi de arena exige que haja uma maior
interação e comprometimento por sua parte. Mas temos hoje um quadro
de meninas prontas para assumir o posto vago, fizemos o concurso e
ele já está em fase de computação de votos. Deste concurso além
do Item Porta Estandarte, possivelmente também será escolhida as
futuras substitutas dos demais itens.
N.G:
Para
você qual é o sentimento de estar à frente desta Brincadeira,
“exatamente” um século depois de Lindolfo Monteverde cria-la? E
como podemos esperar que o Garantido venha para a arena em uma ano
que nos remete a imaginar que haverá um forte resgate a tradição
da brincadeira de boi?
T.P: Estar
a frente hoje do Garantido como Presidente é emocionante e
envaidecedor. A mais de 18 anos trabalho no boi como coordenador,
ajudante, diretor, e estou hoje no posto que é o ápice de todo
torcedor. Ser Presidente do centenário me leva a uma emoção
diferenciada, pela militância, pelas lutas, por tantos dias e noites
dedicadas ao boi. E esse sentimento se confronta com essa enorme
responsabilidade. Temos um título a ser recuperado, temos um
festival para ser feito de forma grandiosa, pois é isso que a nação
vermelha e branca espera. Estar a frente desta luta para fazer esse
resgate da brincadeira no ano do centenário, é uma realização
pessoal, que vou guardar em minha memória com emoção pelo resto de
minha vida.
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