Migrações Nordestinas: A vida de quem veio tentar a sorte no Amazonas
Há aproximadamente um século, segundo indícios da história, surgiram os primeiros focos de migrações de indivíduos nordestinos em direção à região norte do Brasil. A princípio, a causa teria sido a grande seca de 1877 a 1879 que assolou o nordeste fazendo com que milhares de pessoas fugissem de suas terras natais. Este primeiro contingente migratório era formado por pessoas que trabalhavam diretamente com as terras do sertão nordestino, isto é, pequenos agricultores que tinham como único meio de sustento para família o trabalho no campo, o qual era enfrentado com muita luta contra as condições climáticas desta região.
Apesar dos problemas de ordem climática, outro fator que contribuiu grandemente com as migrações nordestinas foi o período do surgimento do ciclo da borracha, que se deu início aproximadamente no ano 1980. Nesse momento da história, cerca de meio milhão de nordestinos, dentre eles indivíduos originários dos estados do Rio Grande do Norte, Paraíba, Pernambuco e principalmente do Estado do Ceará já se encontravam na Amazônia, especificamente nos Estados do Pará e Amazonas.
Nessas fugas e caminhadas em busca de melhores condições de vida e até mesmo o espírito aventureiro nordestino com intuito de conhecer novos horizontes, muitas esposas, filhos e filhas de pequenos agricultores e comerciantes vindos do Ceará, não tiveram outra escolha a não ser acompanhar o marido, chefe da família, na nova jornada rumo à esperança de dias melhores.
Assim é a história de dona Geralda Xavier, hoje com 85 anos de idade, vive no município de Parintins. Nascida em Sobral, interior do Ceará, ela conta que saiu de sua cidade natal aos 25 anos, juntamente com o marido em busca de melhores oportunidades de trabalho e também por curiosidade de conhecer a região norte, e fixou residência primeiramente em Manaus, capital do Estado do Amazonas. Depois de alguns anos, acompanhando o marido a negócios, veio morar em Parintins. A vontade de conhecer esta região era grande pelo fato de seus pais terem vivido aqui na época do ciclo da borracha. “Meu pai veio por causa da promessa que meu tio fez de colocá-lo para trabalhar num seringal, mas ele foi enganado. Quando meu pai chegou aqui não era nada disso”, conta dona Geralda que também não deu explicações sobre o que acontecera com o pai depois de ter chegado aqui. Ela e o marido, já vivendo em Parintins, abriram um comércio de estivas que não deu muito certo, e então depois de algum tempo mudaram para uma loja de ferragens para manterem a família na época em que chegaram. Hoje o comércio ainda existe e é administrado pelo filho mais novo.
Quanto às diferenças culturais, a primeira a ser notado por ela foi o sotaque, “o cearense fala mais feio, quando cheguei aqui às pessoas riam quando eu falava, mas eu fazia de conta que não era nada”, diz ela de forma extrovertida. Embora os motivos de dona Geralda migrar com seu marido para Parintins sejam o de conhecer o lugar onde seus pais viveram um dia e também pelas condições não muito boas de vida que tinham no Ceará, outras histórias de migrações se entrecruzam nos caminhos desses retirantes.
Outra história de vida, mas que se baseia apenas na esperança de dias melhores é a de dona Maria da Conceição que na década de 80, ainda jovem, migrou com seus pais, da cidade de Massapê onde nasceu interior do Ceará, para o município de Parintins. Ela conta que a vida não foi fácil quando chegaram aqui, “meu pai largou tudo lá no Ceará, deixou gado, fazenda e veio pra cá trabalhar com frete, ele comprou um caminhão financiado e assim ele conseguia ganhar algum dinheiro e dava pra viver.” Três anos mais tarde a família voltou para o Ceará por causa de sua mãe que foi acometida de uma doença. Sete anos depois, em 1990, dona Maria casou e migrou novamente para Parintins, mas dessa vez com o marido que tinha uma proposta de emprego em um comércio da cidade. Desde então vivem em Parintins, atualmente são autônomos e possuem um comércio no centro da cidade. Ela conta que nunca teve a ambição de ficar rica, mas conheceu vários conterrâneos que vieram para o município com a situação financeira muito precária, se tornaram comerciantes bem sucedidos e voltaram ricos para o Ceará. “Eu penso em voltar com a minha família para o Ceará, mas por enquanto não se torna possível, nós não temos estrutura nenhuma lá e moramos em casa alugada aqui. Pra irmos precisamos comprar uma casa lá primeiro e arrumar um jeito de ganhar dinheiro”, explica dona Maria Conceição que mesmo sem grandes ambições almeja ter uma casa própria e uma vida mais digna.
Francisca viera da Costa conta que seu marido Jerônimo Farias de Souza vinha freqüentemente para a região norte, através de suas amizades conheceu vários lugares e cidades e dentre algumas do amazonas, se encantou pela cidade de Parintins aonde chegou em 1982, pois uma proposta de trabalho de seu amigo que antes morava na mesma cidade no ceara e logo veio para a ilha tupinambarana. Em sua cidade natal Massapé seu marido trabalhava como agricultor, mas o dinheiro que ele ganhava não dava para arcar com as despesas da casa onde moravam. Com sua chegada na cidade logo começou a trabalhar em um pequeno comercio na João melo onde também morava. Com o tempo retornou para o nordeste para vender seus bens e já trouxe consigo sua esposa, e com essa pequena ajuda financeira logo veio de volta com o intuito de morar e construir uma nova vida. Alugaram uma casinha e com o restante do dinheiro montaram uma pequena lanchonete próxima a lagoa da francesa, e essa atividade os faziam permanecer na cidade.
Dona Francisca a principio estranhou muito o ambiente e o lugar onde estavam o jeito das pessoas eram diferentes do que ela estava acostumada, o modo de se vestir, o sotaque, a culinária totalmente diferente de sua terra. Ela diz que no começo mesmo com o pequeno ponto a condição não era das melhores e sempre pensou em voltar para sua cidade, pois Parintins é uma ilha diferente de massapê, onde se acostumou com todas as adversidades que lhe oferecia. Ao longo da conversa sempre surgem fatos inusitados, como ela mesmo nos conta. Um dia eu fui ao mercado comprar comida e as pessoas começaram a rir quando eu falava. Fiquei sem entender nada, e me chamavam de arigó. Voltei pra casa e contei para o meu marido sobre o acontecido. Ficamos rindo sem entender absolutamente nada do que aquela gente quis dizer. Com isso nunca mais me esqueci daquele dia, e resolvi tirar duvidas sobre o termo que usaram pra indicar que não era uma pessoa da região norte. Francisca diz que sempre quis voltar para massapé, tem saudades de como era o modo do povo daquela cidade, mas seu marido é contra a essa atitude, pois, no lugar que eles se instalaram, como Parintins não tem contra-indicações e sem duvidas é um bom lugar pra se viver.
Um caso que é muito parecido com as outras restantes, é que as mulheres são submissas aos maridos, sem voz para tomar decisões e o próprio rumo. Com certeza é uma questão cultural.
Chegando à cidade de Parintins dona Maria Severina, 68 anos, morou na cidade de juazeiro do norte, conta que a situação do local não era como ela estava acostumada, pois tudo mudou, as pessoas eram diferentes em seus costumes, cotidiano, enfim. Porém era um lugar propício para que pudesse erguer uma nova lida, seguir um rumo mais próspero nas suas vidas. Dona Maria conta: ”No nordeste tínhamos nossas famílias por perto, mas um futuro incerto, sem oportunidades. Naquela época muitos vinham tentar a sorte no norte e pensamos da mesma forma. Porque não ir tentar uma vida melhor em uma nova terra. Imaginou também, que as pessoas que vinham para esta região e não retornavam mais, era um sinal bom de que lá tiveram sorte e progrediram.”
O que ela não contava, apareceu em certo dia e irá permanecer por toda a sua historia. A saudade de sua terra, amigos e familiares que ficaram lá em Massapé. Ela conta que já faz muito tempo que não os vê e, nem sabe como estão se vivos ou mortos, ricos ou pobres. Por vontade e submissão de seus maridos elas acabam por não pra onde optar, ou seja, não podem sair de perto do homem. Mas a vontade só aumenta, de ver a terra querida novamente, e poder enxergar com os próprios olhos o que do passado restou. “meu filho, somente restou à saudade dos velhos tempos de menina, quando eu ia pra campina e brincava com meus amigos de infância. Tempos bons se vão, mas ficam guardados dentro do coração.” Recorda dona Maria.
O fluxo migratório de nordestinos para a região norte foi um fator redundante para boas e não tão boas histórias. Na época áurea da borracha atraída pelas ótimas ofertas de trabalho nos seringais, vivendo num lugar maravilhoso por natureza, onde principalmente teria o que não se tem com abundância naquele lugar, e que o povo do nordeste clama divinamente, a Amazônia ofereceu a eles. A água, que tanto faz falta para os nordestinos.
Vimos nesse trabalho que os modos antigos que se enraizaram na cultura dos nordestinos, como a imposição masculina prevalece sobre as mulheres é um absurdo, porém, somos cidadãos livres para pensar, agir e falar por si só sobre nossas atitudes, sobre nosso destino.
Por: Grupo três.
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