Por: Milanna
Ambrósio e Vitor Gavirati
"A sensação de emplacar uma toada é como fazer um gol".
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Na semana da
gravação do DVD do Boi Caprichoso, o Jornalistando conversou com
Adriano Aguiar, 28, compositor de toadas do bumbá azul. Em 2014, ele
assina quatro canções que estarão presentes no repertório do
touro negro. Adriano é um dos
responsáveis por compor as toadas que o boi da estrela na testa usou
como tema nos últimos três festivais folclóricos: A magia que
encanta, Viva a cultura popular e Centenário de uma paixão.
Na conversa com os universitários, Adriano Aguiar falou sobre as composições,
os planos para o futuro e deu risadas ao contar histórias do
mundo da toada.
Jornalistando:
Como surgiu o seu interesse em compor toadas?
Adriano Aguiar:
Com uns doze anos de idade comecei a me interessar por toadas. Minha
mãe toca violão e aprendi a tocar com ela. Sempre tive interesse em
compor. Nos trabalhos de escola eu gostava de escrever paródias e
procurava me envolver nessa parte de composição.
J.: Você
compõe outros gêneros além de toada?
A. A.: No
Carnaval eu componho marchinhas e, em época de campanha, faço
jingles políticos. Nunca tentei outros gêneros, mas se tivesse
oportunidade, eu arriscaria.
J.: A
primeira toada que você escreveu foi logo aprovada?
A. A.: Não.
Em 2003, compus duas toadas para concorrer, mas não passaram. Voltei
a colocá-las na disputa junto com outras toadas em 2004, e não
passaram. Eu desanimei, pensei que apenas composições entre
as pessoas da “panelinha” da diretoria fossem aprovadas.
J.: E agora
falam que você faz parte dessa “panelinha”...
A. A.: É
verdade (risos). Agora eu estou no meio disso. Até entendo porque
falam isso de que só pessoas “com nome” conseguem ter toadas
aprovadas. Então, em 2007, com as mudanças que o Caprichoso sofreu
na diretoria, na comissão de arte e itens, eu vi esse momento como
uma nova chance de colocar as toadas no CD. Tanto é que tinha muita
gente nova naquele ano, muito compositor novo. E então, foi aprovada
a toada.
J.: Qual foi
a primeira toada que passou?
A. A.: Na
verdade, passaram quatro toadas: Deusa do Amor – que é uma das
mais conhecidas, porque é da porta-estandarte – duas de figura
típica e uma mais tradicional, que fala de boi.
J.: Pelo que
observamos nas suas últimas composições, a maioria delas fala do
amor pelo boi e do festival. Este é o tema que você prefere
retratar nas toadas?
A. A.:
Comentam muito pelo fato de eu conseguir emplacar muitas toadas, mas
isso acontece porque eu faço toadas de todos os estilos, de
celebração, de figura típica, de ritual, etc. Geralmente, cada
compositor tem seu estilo, uns gostam de falar de tema, de tribo, e
eu não. Já consegui fazer em todos os estilos, por isso, a
possibilidade de passar mais toadas é maior. No início, eu fiz
muitas toadas de figura típica. De 2010 pra cá, procurei compor
toadas para a galera, toadas de festa e sentimento.
J.: Há algum
motivo específico para isso?
A. A.:
Financeiramente (risos), a que mais rende é a da galera, pois é
mais tocada e tem mais arrecadação autoral. Não é como ritual ou
lenda, que toca só uma noite. Mas eu gosto dos dois estilos, tanto a
parte tribal quanto a de galera.
J.: Qual sua
composição preferida?
A. A.:
(Pausa) Na verdade, são três: A chegada do meu boi, de 2010, com a
volta do David Assayag, que até hoje o Caprichoso entra com ela.
“Até o coração já se rendeu, bateu mais forte quando viu meu
boi chegar...” (cantou). Sensibilidade – não tem como não
citá-la, porque é um outro formato de toada, que mexe com o
emocional. A outra é Paixão De Uma Nação, do ano passado, que
conta a história de uma pessoa que já fez de tudo no boi.
J.: Você
busca expressar seu sentimento pelo boi nas toadas?
A. A.: Em
algumas toadas é necessário expressar esse sentimento. Existem duas
linhas de criação: as genéricas e as temáticas. Genéricas são
as de item, da galera, de evolução, da Marujada, de entrada e
temáticas são aquelas de ritual, lenda, figura típica, tribal e o
tema principal do boi. De grosso modo, algumas necessitam fundamento
teórico, outras, sentimento.
J.: Você
falou das toadas de tema principal do boi. Nos últimos anos, suas
composições são as escolhidas para embalar a temática do
Caprichoso. Como você conseguiu isso, Adriano?
A. A.: De
2010 pra cá a gente vem acertando. Esse ano, Amazônia Táwapayêra,
na verdade só não é a toada tema porque no CD existem três toadas
que sustentam o tema.
Inovar e expressar o sentimento pelo boisão características das toadas de Adriano |
J.: Adriano, agora explique aos nossos leitores: o tema principal do boi não é
divulgado no edital, então, como acertar o tema na hora de compor?
A. A.: É aí
que entra a questão da panelinha (risos). Na verdade, o slogan é
divulgado, só que a proposta não (risos). Eles falam
superficialmente, até para a proposta do boi não vazar. Como
Táwapayêra, eles falaram que a apresentação teria algo mais
místico, mais tribal, em que a Amazônia aparece de forma
sobrenatural.
J.: Escrever
uma toada de ritual ou lenda e que fale do místico dá mais
trabalho, não é verdade?
A. A.: Sim,
até porque quando você vai se inscrever no concurso de toadas é
preciso entregar em anexo a pesquisa feita sobre o tema. Se levar um
ritual sem fonte de pesquisa ele é desclassificado.
J.: Qual o
seu método de trabalho na hora de compor?
A. A.: Às
vezes, estou andando de moto, ou em um ensaio no curral e até mesmo
no bumbódromo, e vem uma ideia, então, você pensa que ficaria
legal uma toada sobre o que acabou de pensar. Mas tem aquele momento
em que sentamos para compor, pegamos o violão, começamos a
cantarolar, fazer melodias.
J.: Você tem
algumas parcerias. Como funciona o trabalho de vocês?
A. A.: Tem o
Geovane Bastos e o Guto Kawakami. O Geovane sempre foi meu amigo e
gosta de boi. Em 2007, fizemos uma toada de figura típica. Desde
então, mantemos essa parceria. Já o Guto é meu amigo há uns
quatro anos, amizade que começou por causa do boi.
J.: De acordo
com uma matéria publicada no site Parintins 24h, você ajudou a
compor uma toada que estará no Combo Áudio Visual, mas foi sua mãe
quem assinou com Geovane Bastos. Confirma isso?
A. A.: Na
verdade, a minha mãe tinha uma melodia de música, eu só fiz
algumas adaptações, porque o estilo dela de toada é aquele mais
antigo, tradicional. Então, eu modernizei.
J.: Mas Adriano, o que
você acha da modernização das toadas ?
A. A.: Eu
acho que isso é bom. Não querendo desmerecer as toadas antigas, mas
elas não traziam muito conteúdo, apenas o sentimento, a brincadeira
do boi. Agora, com toda essa ramificação que o boi sofreu, com a
entrada do estilo ritualístico a partir da década de 90, o ritual
passou a ser a parte mais esperada do boi, a apoteose.
J.: Mesmo com
todo o trabalho que envolve a composição de uma toada, percebemos
que o compositor não é muito reconhecido. Você considera seu
trabalho desvalorizado?
A. A.: Temos
uma brincadeira interna entre os compositores. Quando estamos
reunidos, comentamos que o nosso momento na mídia é só quando
divulgam as toadas (risos). Depois disso, é item e alegoria, que dão
vida à ideia da toada.
J.: O que um
compositor precisa fazer para ter suas toadas emplacadas com sucesso?
A. A.: Tem
que ser bom (risos)! Ele tem saber o que está fazendo, procurar
ouvir a opinião de outras pessoas, não ficar apenas com a sua
impressão da toada. Eu faço isso! Tem gente que até brinca porque
eu faço lobby, ou seja, ligo para alguém da diretoria e peço
para eles ouvirem a toada. Quando os outros compositores descobrem,
eles brincam: ‘Ah, você estava cantando para o cara?!’ (risos).
Além disso, tem que inovar! As rimas estão muito batidas, são as
mesmas expressões em muitas toadas.
J.: Você
sempre compôs para o Caprichoso. E toada para o Garantido? Jamais?
A. A.:
(Pausa) Tem uma história que algumas pessoas lembram de vez em
quando, mas eu prefiro não lembrar (risos). Tem um concurso de
toadas em Parintins. Em 2011, eu escrevi Miscigenação com Enéas
Dias, compositor do Garantido. Nós colocamos essa toada para
concorrer e ela foi a campeã. Quando uma toada ganha esse concurso,
ela vai direto para o CD do boi. E para ter mais chances de ir para o
CD, escrevemos toadas para os dois bois. A que escrevi para o
Caprichoso ficou em terceiro lugar, e a Miscigenação, que
escrevemos para o Garantido, foi para o CD. Até oferecemos ao
Caprichoso, mas eles recusaram. O Garantido aceitou sem imaginar a
repercussão que teria, porque praticamente levou o boi ao título. E
hoje falam que fui um dos culpados pela derrota do Caprichoso
(risos). No CD, a toada ficou no nome do Enéas e do meu cunhado.
J.: O que
você espera da gravação do DVD do Caprichoso e do festival esse
ano?
A. A.: A
gravação vai ser muito bacana. Vai ser diferente de todas as
gravações que os bois já fizeram. É uma proposta nova, que
envolve magia, misticismo, algo teatral. Vai valer a pena participar
disso, vai ser épico! Sobre o festival: acho que vai dar Caprichoso
(risos).
J.: E quais
os seus projetos para o futuro, Adriano?
A. A.: Eu
estou escrevendo um livro sobre a divisão que existe entre as toadas
agora: as temáticas e as genéricas, que podem ser chamadas de
comerciais e de arena também, respectivamente. Se tudo der certo,
antes do festival estarei lançando.
GRUPO: Gilvaneide
Castro; Kayla Lima; Milanna Ambrósio; Vitor Gavirati; Wanderley.
Créditos de foto:
Facebook de Adriano Aguiar e Site Parintins.com